Valores: Criatividade, Liberdade, Respeito
Naturalidade: Setúbal
Idade: 37 anos
Como sempre teve medo de hospitais, Paula Moita pensou num projeto que pudesse humanizar as salas de urgências pediátricas dos hospitais. Pouco tempo depois, surgia o Dar Cor à Vida que rapidamente conquistou pacientes e profissionais de saúde. Há sete anos que esta designer, "amante da cor" , se inspira nas pessoas e pinta-lhes a vida de muitas cores.
Depois de estar quase a desistir do meu projecto [Dar Cor à Vida], em Janeiro de 2006 sou contatada por um cirurgião pediátrico que me convidou para criar um projeto para Internamento Pediátrico, do novíssimo edifício de Pediatria no Hospital São Francisco Xavier. Despedi-me de um trabalho temporário para criar o projeto em menos de um mês. Foi a concurso e foi o escolhido. Em Fevereiro, criei uma equipa de 7 pessoas e, naquele mês, pintámos todo aquele espaço.
Neste tempo de espera, até ter começado, tive um familiar muito próximo com uma doença terminal, o qual acompanhei a muitas idas e vindas aos hospitais e percebi que muito havia a fazer para humanizá-los. Comecei a estudar como poderia tornar um ambiente mais acolhedor só através das cores. E, a partir daí, essa tornou-se a minha maior paixão: como as cores podem fomentar mudanças positivas nas pessoas.
Quando comecei a pintar hospitais comecei a perceber como este trabalho era importante não só para os utentes, mas, mais ainda para a equipa médica que passa grande parte da sua vida naquele espaço. Percebi que muito havia a fazer, por isso o projeto cresceu para se tornar numa associação de intervenção artística que, desde a sua criação, pretende unir artistas e equipas médicas para, cada vez mais e de uma forma eficaz, transmitirmos tranquilidade e aconchego através das cores.
Os valores que o Dar Cor à Vida tenta passar são: criatividade, liberdade, confiança, respeito, segurança e alegria. Considero que a criatividade é a chave para todos os nossos problemas. Quando defendo que devemos exercitar a nossa criatividade não é, de longe, querer que todos sejamos pintores. É antes querer que todos tenhamos a consciência de que, através do exercício da criatividade, conseguimos resolver todos os obstáculos que vão surgindo ao longo da vida, pintando assim, as nossas próprias vidas.
Através da liberdade, percebi que ao trabalhar com seniores o grande entrave para a criatividade é a falta de liberdade em tenra idade para que cada um se possa expressar de uma forma livre e como ser único que é, de uma forma única sem certos ou errados. Por isso, é das grandes missões da Associação proporcionar a bebés, crianças e adultos essa liberdade e consciência e que a expressão de cada ser nada pode ter de errado nem tem de ter a obrigatoriedade de ser “bonita” ou harmoniosa aos olhos dos outros.
A pintura tem uma coisa fascinante que é ter a capacidade de pôr uma pessoa a comunicar com ela própria e torná-la mais consciente de si . Quando se consegue esse momento, de estarmos com nós próprios, tornamo-nos mais confiantes levando-nos a mostrar aos outros quem somos, até porque é uma comunicação sem palavras, logo, menos susceptível de interpretações erradas.
Cada pessoa tem um ritmo, tem um sentido estético, tem os seus valores e crenças, limitações físicas, formas de estar e de agir... Cada pessoa é um ser único e como tal o Dar Cor à Vida pretende, por onde passe, que as pessoas sintam que foram respeitadas, que podem ser elas próprias tanto quando pintamos uma parede, quando vamos pintar com uma criança num quarto de hospital ou quando fazemos ateliers de pintura. Não pretendemos ensinar habilidade técnica na área da pintura, mas sim, despertar a importância de nos expressarmos e de como as cores podem ser um fomentar de mudanças positiva nas nossas vidas.
Esperamos que quem nos contate tenha total confiança no nosso trabalho, que quem usufrua das nossas pinturas dentro de um hospital sinta que mudámos a imagem deste espaço, que passou de um lugar inóspito e de doença, para um lugar seguro e agradável para tratar da sua saúde.
Alegria é o objetivo final do Dar Cor à Vida. Provocar a alegria por onde passamos ”que dá saúde e faz crescer”.
Onde vou buscar inspiração? Nas pessoas. Tanto num sorriso de um bebé, como nas cores que ele deixa impressas no papel com as suas mãos, como nos enfermeiros que nos contam como seria o seu hospital de sonho.. ou num idoso que conta as suas tristezas ou memórias... ou nos olhos brilhantes de uma criança quando vê as nossas ilustrações numa parede de hospital e diz que parece mágico, que parece um livro gigante...ou no olhar triste de um pai que tem de deixar o seu filho num quarto de hospital.
O poder da cor na vida das pessoas é enorme, mas a maioria das pessoas não está desperta para a sua importância. Quando vamos ter com alguém, ainda mesmo antes de fazermos qualquer gesto ou emitir alguma palavra, já comunicámos com as cores através do que trazemos vestido. Normalmente usamos as cores como espelho do nosso estado de espírito.
Quando dou formações desafio as pessoas a usarem a cor como um agente de mudança. Aproveito para fazer aqui também o desafio: vistam uma cor que nunca usem e vejam como essa cor vos influencia. Basta um acessório.. um cachecol, um lenço. A experiência é sempre muito engraçada.
Embora estude a influência das cores, não tinha ainda assim a total noção da força delas. Uma vez numa formação, falava eu sobre as cores frias e as cores quentes. Fiz um exercício no qual podiam pintar como quisessem. Os da minha direita pintavam todos com cores quentes e os do meu lado esquerdo, com cores frias. E o que há a dizer sobre as cores frias? Que nos provocam uma sensação de frescura ou mesmo frio e que nos dão sensação de afastamento. As cores quentes o inverso, aproximam-nos. Quando dei conta, as pessoas que estavam com as cores frias rapidamente acabaram e as que estavam com as cores quentes continuavam a pintar. De facto, as cores quentes aproximam e as cores frias afastam.
Nos hospitais tenho mesmo muito cuidado com o uso das cores. Não faço ilustrações que tenham vermelho. O vermelho pode dar energia em pequenas quantidades mas em demasia pode criar irritação. Quando uma pessoa se sente debilitada, acredito que estará também muito mais sensível às cores. Nesses casos, tento usar em maior quantidade o verde e azul por serem cores que nos transmitem tranquilidade e limpeza e aqueço o espaço com pequenos apontamentos em cores quentes.
Nunca preencho paredes inteiras e faço ilustrações mais complexas em corredores que são lugares de passagem. Tento sempre tirar partido do branco que funciona como uma vírgula na leitura da pintura. O olhar também precisa de descansar. Acho que essa característica até é a mais marcante na distinção de uma pintura do Dar Cor à Vida de outras e que é muito apreciado pelas equipas médicas, que afinal, são quem mais convivem com as pinturas. Também é importante incluir o laranja que nos dá vitalidade e o rosa porque a ele está associado momentos de felicidade e ternura.
Já numa divisão de uma casa, tenho o cuidado de saber qual a sua utilidade para poder estudar que cores e que quantidades utilizar. Se tiver que falar em público como sou muito tímida não posso dispensar o vermelho, que sei sempre que me ajuda a ganhar força e confiança.
Ao longo destes anos a pintar, percebo que muitas vezes as pessoas vão pelas tendências e não pelos estudos dos efeitos que a cor pode ter em nós e que alguns em ambientes provocam, às vezes, mau estar e insónias, sem que as pessoas saibam o porquê. Se perguntarmos se tem alguma coisa na casa com a sua cor preferida normalmente as pessoas não têm, seguiram as tendências.. Acho preferível seguirem os seus gostos. No entanto, não vou dizer que não sou influenciada pelas tendências, tento é usá-las forma consciente.
Talvez o projeto do Internamento do IPO tenha sido dos mais desafiantes. Pensar que as minhas ilustrações seriam vistas pela mesma pessoa, que pode estar em isolamento vários meses no mesmo quarto, assustou-me! Fez-me pensar que podiam odiar o meu trabalho e isso fez-me pensar sobre o assunto, dias e dias, e conversar com pessoas que tiveram essa experiência, para poder perceber onde a pintura poderia marcar a diferença no dia daquelas pessoas. Mas acho que ainda me estou a preparar para maiores desafios.
Trabalhar com crianças internadas é sempre mais fácil para mim; elas dão-nos a sua sinceridade, a sua curiosidade, sabem sempre muito bem o que querem e dão-nos a melhor paga: o sorriso delas. Gosto desse trabalho mais íntimo, em que posso dedicar-me apenas a uma pessoa.
Pintar uma parede para adultos é mais difícil porque não se está a ver rostos, gostos específicos. Parece que temos a ilusão que fazer coisas para adultos é fazer coisas sérias, para pessoas sérias. Cada vez mais percebo que, quando estamos doentes, também queremos ser um pouco crianças, que nos peguem ao colo e nos dêem um pouco de fantasia e a magia do sorriso de um palhaço.
Próximos planos para o Dar Cor à Vida? Estar cada vez mais próximo das pessoas, em que o contacto com as tintas e a influência das cores que pintam, possam fazer toda a diferença nos seus dias e na construção do seu ser.