Tem um projecto próprio? Pretende alargar o seu negócio a novos mercados? As oportunidades num mundo globalizado e com fronteiras cada vez mais ténues, são claras e evidentes e, graças às novas tecnologias e novos sistemas de informação e comunicação, hoje as empresas estão inseridas numa rede global. Comunicar tornou-se mais fácil e rápido do que nunca. Contudo, a concorrência ganhou outra dimensão e, no contexto internacional, só faz sentido comunicar se esse processo se revelar eficaz junto dos seus públicos-alvo.
Embora prevaleça, actualmente, uma sensação de partilha de um conhecimento comum, fruto dos benefícios da Internet e da maior mobilidade de pessoas entre países, comunicar por exemplo em Portugal e no Brasil dificilmente poderá ser feito da mesma forma. O modo de percepção de uma mesma marca poderá variar de cultura para cultura.
A cultura
A cultura, de facto, influencia tudo o que um povo faz; resulta de experiências comuns e que são transmitidas ao longo de gerações. Existem vários e distintos níveis numa dada cultura, sendo os comportamentos e artefactos mais facilmente identificados do que as convicções e valores, de base moral, societária ou religiosa. Já as designadas premissas básicas de uma cultura são tendencialmente situadas num plano inconsciente, estando muito enraizadas e sendo as mais difíceis de percepcionar, por estarem ligadas à relação dos indivíduos com a natureza humana, a natureza da realidade e do tempo. Torna-se assim importante compreender a todos os níveis e de forma aprofundada as diferenças “cross-cultural”.
A comunicação “cross-cultural”
A comunicação “cross-cultural” ajuda efectivamente a minimizar o impacto dessas diferenças contribuindo para uma comunicação mais eficaz e, por isso, deve ser tida em conta na hora de se querer desenvolver uma campanha de comunicação destinada a uma cultura em particular.
1. A língua. Na comunicação “cross cultural”, a língua é indiscutivelmente um factor critico. É muito importante perceber o valor semântico das palavras e o contexto em que elas devem ser utilizadas. Em Portugal diz-se que a língua portuguesa “é muito traiçoeira” ; o mesmo aplica-se às línguas de outros povos, igualmente ricas em expressões idiomáticas e provérbios. Existem em todas as línguas os conceitos “intraduzíveis” e os que têm significados ou conotações distintas em diferentes culturas. Assim, por exemplo, na construção de um claim e do texto publicitários, deve-se examinar o significado de cada palavra ao pormenor e ter em atenção a construção frásica e o tom da mensagem para não ter resultados inesperados e negativos. Pessoas de diferentes culturas podem naturalmente ter diferentes realidades sensoriais, interpretando a informação (imagens, símbolos, palavras) de acordo com o seu contexto. Devemos ainda considerar se num país se fala mais do que uma língua e se existem dialectos a ter em conta e quais os sotaques predominantes na comunicação em TV. Veja-se o exemplo da Índia, onde inglês falado é muito diferente do que o Inglês britânico, quer ao nível da pronúncia quer ao nível do uso de expressões idiomáticas.
2. O estilo de comunicação. É preciso considerar a forma como as pessoas comunicam, ou seja, ter em conta o estilo de comunicação, podendo este ser mais implícito ou explicito. O exemplo mais conhecido é o dos EUA onde a comunicação é explicita e o do Japão onde a comunicação é implícita. Nos EUA quando se faz uma campanha parte-se do principio que o receptor não tem umbackground informativo sobre um determinado assunto pelo que na campanha de comunicação, a informação utilizada é no sentido de responder a essa probabilidade. Dá-se mais ênfase às palavras. No Japão, toda a comunicação é implícita admitindo que o receptor está contextualizado e devidamente informado, sendo a comunicação feita de uma forma elegante transmitindo serenidade, com o recurso a dicas, sugestões e nuances.
3. Os padrões de comunicação variam muito de cultura para cultura, e na publicidade isso pode ter influências ao nível do conteúdo e no próprio processo de conceptualização. Os franceses, ao contrário dos americanos, não gostam de mostrar as suas emoções em público e gostam de valorizar mais as imagens, os elementos gráficos, e todo o aspecto criativo de um anúncio publicitário, como se de um obra de arte se tratasse.
4. A música é igualmente relevante no desenvolvimento de uma campanha. Sabemos que, por exemplo, o povo espanhol ouve tradicionalmente música em castelhano e as publicidades são dobradas, o que revela uma preferência assumida pela língua mãe e pouca recetividade a outras línguas. Ao nível da música, poder-se-á explorar o simbolismo de uma determinada canção ou som de um instrumento.
5. Cores, números e imagens são outros elementos a ter em conta na comunicação “cross-cultural”. O simbolismo das cores e as preferências por determinadas cores variam de cultura para cultura. No Ocidente o vermelho está associado ao amor e à paixão, já no Oriente significa celebração e boa sorte e, por exemplo, as mulheres na China casam de vermelho enquanto que no Ocidente fazem-no na maioria das vezes de branco, devido a este tom estar associado à pureza.
No que diz respeito à imagem, o papel da mulher na sociedade ou a religião podem ditar muito a forma de apresentar a imagem. Em França, por exemplo, foi proibida a campanha “arrojada” da Renova “Amor Causa por François Rousseau”, por “poder ferir as convicções religiosas do público”. Uma marca pode agir de boa fé e, no entanto, por comunicar de forma errada e ser mal interpretada com consequências graves para a sua notoriedade e resultados nas vendas.
É muito importante perceber se há uma religião maioritária ou se estamos numa sociedade multicultural, com muito imigrantes, onde existem várias religiões como na dos EUA. Ao nível dos padrões de relacionamentos, compreender se estamos numa sociedade que preza o individualismo ou o colectivismo; se temos uma sociedade que valoriza a família ou não; se temos uma sociedade muito ou pouco hierarquizada. Mesmo compreender o modelo familiar vigente é importante ou saber se as pessoas valorizam os animaise como os estimam e quais privilegiam. Os animais são elementos que podem ser muito utilizados na publicidade e assumirem um valor simbólico relevante.
6. Os hábitos das pessoas e os estilos de vida de uma cultura devem ser analisados, mesmo porque podem ditar muito como as pessoas consomem notícias e identificar os media tradicionalmente preferidos. Os comportamentos de compra podem estar muito relacionados com razões psicossociais e intrinsecamente ligadas à cultura de um povo.
7. É igualmente importante conhecer o clima, a dimensão do país, factores históricos, geográficos, socioeconómicos ou políticos para perceber melhor a cultura de um pais. Países comunistas como a China ou a Rússia fecharam os seus países ao mundo durante décadas padronizando o seu conhecimento e forma de aprendizagem. Hoje as pessoas sentem-se muito atraídas pela cultura Ocidental e estão muito permissíveis à publicidade vinda dessa cultura.
A questão da abertura de uma cultura a outra é importante bem com a de perceber qual a imagem que símbolos de determinadas culturas são vistas por outras. Por exemplo, os Japoneses apreciam ter nos anúncios Estrelas de Hollywood, ainda que nem todos percebam o inglês na perfeição. Mas as figuras americanas criam uma atmosfera, um efeito dramático que contribui para o sucesso do anúncio. Por nem sempre haver uma associação clara da personagem com o produto, é proibido exibir estes anúncios fora do Japão.
Para além destes factores todos referidos, todos os outros princípios da comunicação devem ser tidos em conta na comunicação "cross-cultural", como o que é atractivo para o público-alvo e quais são as suas aspirações.
Compreender uma cultura é, de facto, uma questão complexa, sendo fundamental ter essa consciência e reconhecer que existem diferenças culturais e, acima de tudo, é necessário saber respeitá-las. Idealmente, dever-se-á ter um contacto muito directo com essa cultura para senti-la, vivê-la, mas nem sendo isso sempre possível, dever-se-á consultar pessoas que têm um conhecimento muito profundo do mercado e da cultura a atingir.
“Think local, act global”
Do ponto de vista estratégico, a comunicação deve ser sempre “glocal”, evocando o lema “think local, act global de Jean-Marie Dru (1996)”. E o exercício é simples: mover constantemente do local para o global e voltar ao local. A publicidade realizada por qualquer marca deve atrair os consumidores de uma cultura local. Deve reflectir o dia-a-dia dos habitantes locais, bem como os valores, atitudes e crenças da sua cultura.